A turma de 31 e os irmãos do arco-íris

por Dorival Strelow
Corria o mês de abril de 1931. A 18 de abril, a segunda mãe de Chico Xavier lhe chama e avisa de que estaria de partida. Sente que seus dias na Terra terminaram. Chico chora, pedindo a ela que ficasse, que não o abandonasse à própria sorte. Era ela a única pessoa da confiança do médium, em quem ele depositava a esperança de dias melhores. Era com ela, e somente com ela, que Chico se abria, contando tudo quanto via e ouvia do mundo espiritual, numa cidade em que a maioria das pessoas não lhe dava crédito, ou o considerava louco, ou mesmo tomado pelo demônio, tendo em vista a grande maioria católica de Pedro Leopoldo. Dona Cidália Batista Xavier, no entanto, sente que o final do corpo está próximo. Diz ao Chico que ao chegar no mundo espiritual vai pedir a Jesus que lhe envie alguém para substitui-la na afeição e no devotamento a ele. Além disso, ele seria acompanhado pelos irmãos do “Arco-íris”, na vida espiritual. No dia seguinte, 19 de abril de 1931, Dona Cidália desencarnou, deixando o Chico desconsolado de angústia. Um grande sentimento de solidão e melancolia tomou conta do médium.
No mês seguinte, em maio, o espírito de Emmanuel aparece para o Chico pela primeira vez. Inicialmente, Chico o vê na reunião pública do Centro Espírita Luiz Gonzaga e nesta mesma semana, ao pé da cachoeira, à beira do rio, Emmanuel lhe fala pela primeira vez, convidando-o ao trabalho com o Cristo, e pedindo-lhe disciplina, disciplina e disciplina. Chico aceita o desafio e começa a nova fase de seu trabalho mediúnico, iniciado em 8 de julho de 1927, desta feita sob a coordenação direta de Emmanuel, que passa, então, a ser o orientador geral das comunicações por seu intermédio.
Durante o ano de 1931 os companheiros mais próximos da tarefa no Centro Espírita Luiz Gonzaga, fundado em 1927, debandam. Cada qual, com suas razões particulares, abandona o posto, deixando Chico sozinho. Sob a orientação de Emmanuel, a rotina de Chico Xavier, entretanto, prossegue durante três reuniões públicas semanais no centro espírita fundado por ele anos antes. A assistência física, contudo, desaparece. Chico faz as reuniões sozinho. Até seu irmão mais velho, de sua inteira confiança, José Xavier, se afastara por ter encontrado um emprego noturno, não podendo atender ao compromisso doutrinário. Sentindo-se só e abandonado em determinada reunião de fins de 1931, Chico Xavier resolve encerrar as tarefas mediúnicas públicas. Argumenta com o espírito de Emmanuel que ele escrevia páginas muito lindas, mas que ele, Chico, se incomodava com a incompreensão de seus conterrâneos e a ausência dos confrades para a tarefa. De nada adiantava ficar lendo em voz alta e estudando as obras de Allan Kardec com os comentários espirituais ditados por Emmanuel uma vez que ninguém estaria ali para acompanhar aquelas belezas espirituais.
Emmanuel então lhe diz: “Você, por acaso, pensa que está só na tarefa?” Chico lhe responde: “Sim, o senhor não está vendo? Estou sozinho! A não ser o senhor comigo não há mais ninguém conosco! De que adianta prosseguirmos com as reuniões públicas? Até os meus vizinhos já se incomodam comigo falando sozinho e já estão espalhando na cidade o boato de que estou ficando louco! O senhor não está vendo isso acontecer?” Responde-lhe o benfeitor: “Sim, Chico, estou vendo a calúnia e a maledicência se espalharem, mas devemos ter paciência e compreensão evangélicas em relação a elas. Silêncio e oração, fé resoluta e serviço com o Cristo haverá de ser a nossa única resposta!”
Chico, conformado, pergunta a Emmanuel: “O que fazer diante desse enigma?”
Foi então que o espírito de Emmanuel, apiedado do sofrimento do rapaz, com poucos 20 anos de idade, lhe afiançou: “Não encerre as reuniões públicas. Eu pedirei a Jesus a bênção de abrir-lhe totalmente as faculdades mediúnicas da vidência para que você possa acompanhar e atestar que não estamos sozinhos nas tarefas do centro espírita. Se Deus assim o permitir, você verá os irmãos que nos acompanham do plano da vida espiritual. Na próxima quarta-feira, esteja aqui para as tarefas habituais”.
Chico, disciplinado que era, esqueceu o desejo de encerrar as reuniões e no dia aprazado lá estava ele para a tarefa. Sozinho no recinto, leu um trecho de O Evangelho segundo o Espiritismo e outro de O Livro dos Espíritos, de Allan Kardec. Comentou-os em alta voz para, em seguida, dedicar-se à tarefa da psicografia com o espírito de seu mentor Emmanuel. Até então nada de novo havia se apresentado para sua observação ambiente. Permanecia, aos seus olhos terrenos, tão-somente na companhia de seu guia espiritual.
Ao terminar a psicografia da noite, contudo, Emmanuel lhe aplicou passes na região cerebral, atingindo em cheio os centros coronários e cerebrais com energias novas. Em poucos instantes, Chico Xavier passou a observar verdadeira multidão de espíritos desencarnados, assistindo às tarefas, calmamente sentados numa espécie de arquibancada do além. Como se as paredes do Centro Espírita Luiz Gonzaga se alongassem a distância. Emocionado, leu as páginas psicografadas por Emmanuel naquela noite, reparando o efeito que suas palavras tinham naquela gente toda, a assistência espiritual atenta.
Ao terminar a leitura, ficou reparando aqueles rostos diferentes. Tentava, em vão, ligar aquelas fisionomias, que nunca houvera visto antes, às famílias conhecidas de Pedro Leopoldo. Pensava ser, talvez, o pessoal desencarnado de sua cidade natal, mas identificou certa dificuldade em resolver o problema. Não conseguia associá-los às famílias locais com quem privava conhecimento. “Que espíritos eram aqueles? De quem seriam aquelas fisionomias simpáticas a fitar-lhe com carinho e respeito?” Externou a Emmanuel o assunto para ouvir dele, sorridente, a seguinte revelação profética: “Este pessoal, que você agora observa com nitidez, é o grupo espiritual de cerca de 5.000 espíritos simpatizantes do Consolador prometido por Jesus Cristo, que tem vindo estudar conosco a Boa Nova do Evangelho, renovada pela compreensão da Doutrina dos Espíritos. Eles todos estão, presentemente, num curso preparatório da próxima reencarnação, quando estarão, no futuro, na face da Terra para acreditar nessas mensagens que agora estamos escrevendo por seu intermédio, e com a finalidade de estudá-las e espargi-las, difundindo entre os homens de boa vontade a palavra da Vida Eterna. São eles, Chico, que lhe auxiliarão na tarefa a partir de meados deste século e até o final de seus dias terrenos, e mesmo depois de sua desencarnação, para que a mensagem espírita-cristã possa atingir os corações realmente interessados em espiritualização no Brasil, ou até mesmo no exterior”.
Uma alegria indefinível inundou o coração de Chico Xavier, que então, carinhosamente, endereçou àquela assembleia diferente o seu olhar de carinho, amizade e amor. Reparou diversas tonalidades de cores envolvendo-os de Mais Alto, como se o plano da Vida Maior estivesse acompanhando aquela cena e endereçando a eles forças novas para o futuro. E Chico então disse a seu benfeitor Emmanuel: “Agora compreendo. Como fui infantil ao considerar que estávamos sozinhos! A partir de agora, vou chamar os nossos novos amigos de irmãos do “Arco-íris”, em homenagem à nossa querida mãezinha Dona Cidália, que a eles fez referência no passado. Quem sabe essas luzes multicoloridas que descem do Alto, envolvendo-os, não procedem do coração amoroso dela a dizer-me, confiante, que não estou só!”
Conforme nos contou Chico Xavier, as reuniões públicas três vezes por semana no Centro Espírita Luiz Gonzaga de Pedro Leopoldo permaneceram ainda totalmente vazias na face da Terra, por quase 3 anos, de 1931 até 1934! Emocionado, ao terminar o seu relato, Chico me revelou que eu era um daqueles que estavam naquela assembleia de aprendizes, e ainda que no transcorrer de minha atual existência física eu iria, paulatinamente, reencontrar os 5.000 corações queridos e afins que participaram daquela universidade do espírito. Disse-me Chico assim: “Aos poucos, você vai reconhecê-los todos, Geraldinho, da turma de 31!”

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