Por Alexandre Caldini*
2019 se inicia. Viveremos momentos conturbados e caóticos. Ou seriam momentos de fascinantes oportunidades? O modo como vemos o mundo depende de nosso olhar. E nosso olhar depende de onde estamos e de quem somos. Mas independentemente do olhar, parece mesmo que, de repente, tudo virou no avesso!Veja estes 10 pontos:
1. O desemprego cresce e a miséria aumenta.
2. O crime se organiza em poderosas facções e a criminalidade nos mantém tensos em tempo integral.
3.
Multidões fugindo da miséria e violência se deslocam dos países
africanos e da Síria para a Europa; dos países centro-americanos para os
Estados Unidos; e da Venezuela para o Brasil e seus vizinhos.
4. Os gêneros crescem exponencialmente passando de dois – masculino e feminino – para mais de cinquenta.
5. Em vários países, amparados pela lei, pessoas do mesmo sexo se casam.
6. As chamadas minorias – étnicas, sexuais, religiosas e de origem – são acolhidas por uns e perseguidas por outros.
7.
A riqueza está concentrada na mão de poucos: cinco brasileiros têm mais
dinheiro que metade de toda a população brasileira. Os bancos
brasileiros cobram juros de 300%, mas pagam apenas 5% pelo dinheiro
depositado.
8. Líderes religiosos mercantilizam os templos.
Religiosos de quase todas as religiões são acusados de abusar
sexualmente de quem lhes procura em busca de apoio, esclarecimento e
alívio para suas dores.
9. Políticos fazem negócios e negociantes fazem política. E muitos, de ambos, enriquecem ilicitamente.
10. Cresce vertiginosamente a incidência das doenças da alma: depressão, síndrome do pânico e suicídio.
Por que de repente tudo mudou? Por que Deus permitiu tamanha mudança?
Estaria a Terra, e estaríamos nós que aqui vivemos, involuindo? Ou seria isso tudo progresso?
E nesse ambiente conturbado, como nós, espíritas, devemos nos portar?
Que pensar? Que dizer? Que fazer? E o que não pensar, não dizer e não fazer?
Para compreender qual deve ser nosso comportamento como espíritas, busquei os temas que mais nos incomodam neste momento. São assuntos espinhosos, contundentes e polêmicos como a intolerância, a violência, o armamento, o respeito às chamadas minorias, o feminismo e o casamento entre pessoas do mesmo sexo. São temas que dividem opiniões, inclusive entre espiritas. Para tentar compreender mais sobre eles, o melhor é sempre consultar a literatura básica da filosofia espírita – os livros organizados por Allan Kardec – sobretudo O Livro dos Espíritos e O Evangelho Segundo o Espiritismo. As 15 perguntas a seguir buscam em Kardec, as respostas.
Por que Deus permite que o mal prospere e os bons sofram?
Deus
nos deu o livre arbítrio. E também nos deu a eternidade para
melhorarmos. Junto dela nos deu a dor para que percebamos onde erramos.
Se ainda sofremos é porque ainda agimos no mal. O mal não prospera; o
que acontece é que ele surge mais viçoso quando os homens – que se
permitem iludir – por ele nos encantam e lhe dão força. Mas quando
olhamos no longo prazo, vemos o quanto a humanidade já “se humanizou”. O
bem é, inexoravelmente, o destino de todos nós.
O capítulo 5 do Evangelho Segundo o Espiritismo
ensina: “Os sofrimentos com que nos defrontamos na vida presente,
devido às causas anteriores, são na maioria das vezes, como também o são
os das faltas atuais, a consequência natural dos erros cometidos, ou
seja: por uma rigorosa justiça distributiva, o homem suporta o que fez
os outros suportarem.”
Como pode a Terra estar evoluindo se no passado tudo era melhor?
Quem
disse que o passado era melhor? Recauchutamos o passado para que pareça
doce e belo. Não era. Nunca foi. Basta assistir algum documentário
sobre o Império Romano e a Grécia antiga para que se veja ali paixões
vis, traições, crueldade e corrupção. Basta ver o quanto Cristo sofreu,
para percebermos a parcialidade interessada, a ganância, o preconceito e
a tortura.
Por que será que as cidades medievais da Europa eram
muradas? Por que os castelos eram no topo de montanhas e carcados por
fossos? Será que a vida por ali era de respeito e tranquilidade? Será
que os povos das nações africanas achavam que suas vidas como escravos
eram boas? Por acaso a vida foi boa para os não-arianos, os judeus, os
homossexuais, os portadores de deficiência e os comunistas durante o
nazismo?
O passado não foi melhor que os dias atuais. Nos iludimos!
Hoje a lei proíbe que se escravize, não há canibalismo, não se faz mais
sacrifício humano e os direitos humanos, se ainda não são plenamente
respeitados, ao menos já são objeto de atenção.
O presente é muito
melhor e mais civilizado que o passado. Mas se quisermos acelerar o
passo para usufruir de mundos melhores, o capítulo 3 do Evangelho Segundo o Espiritismo
nos dá o norte, dizendo que nos mundos felizes…”O homem não procura
elevar-se acima do homem, mas acima de si mesmo, aperfeiçoando-se.”
Por que alguns têm tanto e outros tão pouco?
Porque
ainda somos obtusos, mesquinhos e egoístas. Achamos que ter importa
mais que ser. Quantos há que nem água tem? Muitos. No Brasil inclusive.
Muitos passam o mês com o Bolsa Família enquanto outros de nós, sem a
menor cerimônia, gastamos o mesmo valor numa garrafa de vinho. As cinco
pessoas mais ricas do Brasil, tem mais dinheiro que mais da metade da
população brasileira. Nós como espíritas, podemos sossegar com essa
discrepância? As perguntas 705 e 717 do Livro dos Espíritos
nos alertam: “a terra produziria sempre o necessário se o homem soubesse
se contentar” e “os que vivem à custa das necessidades dos outros
exploram os benefícios da civilização em seu proveito. Eles têm da
civilização apenas o verniz.” Segundo a FAO/ONU, 30.000 seres humanos
morrem de fome no mundo…todos os dias! Muitos de nós somos obesos por
comer além do necessário. Outros somos obesos de bens, por ter além do
necessário. Obesidade do corpo, sabemos, mata o corpo. Mata o nosso
corpo e o dos que deixaram de comer porque comemos o que poderia
alimentá-los. Obesidade de bens, talvez não saibamos ainda, nos mata por
dentro, mata nossa alma. A pergunta 806 afirma que as diferenças
abissais de renda desaparecerão da Terra: “(a desigualdade social) É
obra do homem e não de Deus. Desaparecerá juntamente com o predomínio do
orgulho e do egoísmo, apenas restará a diferença do merecimento.”
Como compreender os que defendem matar em nome de Deus?
Os
que promovem as guerras ditas santas e os que defendem “seu” Deus como
sendo o único e mais forte, são espíritos ignorantes (boa fé) ou
espertos e vis (má fé). LE, a pergunta 671 diz: “Todas as religiões ou
melhor todos os povos, adoram a um mesmo Deus, tenha um nome ou outro.”
Já na pergunta 842 vemos: “Toda doutrina que semear a desunião e
estabelecer uma demarcação entre os filhos de Deus só pode ser falsa e
nociva.”
Nesse sentido vale ponderarmos o seguinte: nós espiritas nos
dizemos cristãos. Mas o que isso significa? Se significar que admiramos
e seguimos o exemplo do espirito iluminadíssimo que é Jesus Cristo,
está ótimo! Sigamos assim. Mas se dizer-se Cristão significa
desconsiderar e desrespeitar os que não são cristãos, isso, não é seguir
o que Cristo nos ensinou. É ser não cristão! Como nós, espíritas,
podemos admitir “estabelecer uma demarcação” entre nós cristãos e os
ateus, ou agnósticos, ou judeus, ou candoblecistas, os hinduístas, ou
muçulmanos ou budistas ou siquistas? Usemos da inteligência, do bom
senso e do amor que Deus nos deu. Sejamos espelhos do Cristo, amando a
todos.
Ainda na questão religiosa, outro ponto importante a que nós
espíritas devemos estar atentos, é sobre os chamados falsos profetas. No
capítulo 21 do Evangelho Segundo o Espiritismo, se lê: “Desconfiai
daqueles que dizem ter a posse única e exclusiva da verdade!” e “Todo
aquele que revele o menor sinal de orgulho, fugi dele como uma praga
contagiosa que corrompe tudo o que toca”. Uma das maiores belezas do
espiritismo é que ele não tem dono. Não temos um líder. Não há quem
possa falar em nome dos espíritas. Cada casa espírita cuida de si e isso
é maravilhoso! A idolatria já se mostrou extremamente nefasta,
perigosa. Kardec e Chico nos deram ótimos exemplos: gigantescos
trabalhadores, ambos viveram pelos outros e pelo espiritismo, mas jamais
aceitaram que os idolatrassem. Sigamos seus exemplos. Espíritas que
somos, não idolatremos espíritas.
Qual deve ser a postura do espírita diante da violência?
Espíritas,
sabemos da existência de Deus. Sabemos também que a morte existe apenas
para o corpo. Então por que tememos a violência? Porque no fundo não
confiamos nem na justiça divina, nem na imortalidade do espírito, e
pior: nem confiamos em Deus! É certo que devemos preservar a encarnação,
mas o apego ao que é material só nos causa medo e angústia, que podem
levar à más ações. A pergunta 738 afirma: “A vida do corpo é pouca
coisa; um século de vosso mundo é um relâmpago na eternidade. Portanto o
sofrimento que sentis por alguns meses ou alguns dias não são nada.”
A
postura do espirita deveria ser de combate ao que causa a violência: a
ignorância, o egoísmo, a ganância, a miséria e a falta de amor. E,
claro, enquanto caminhamos para o bem, o homem ainda rude que afronta a
existência do outro, tem que ser impedido de seguir agindo mal. Mas
devemos sempre agir dentro de padrões de civilidade, longe da violência e
da crueldade, para que a autoridade não se iguale ao meliante.
O tema tortura tem estado em evidência. Há alguma menção sobre isso na obra de Kardec?
Lembremos
que Jesus, justo, foi torturado pelos poderosos de seu tempo ao que
afirmou: “Pai, perdoa-lhes, porque não sabem o que fazem.” Kardec
menciona a crueldade na pergunta 752 do LE: “Se a destruição é, às vezes
uma necessidade, a crueldade nunca é; é sempre o resultado de uma
natureza má.”
Chocados com a violência e desiludidos com a impunidade,
alguns espíritas defendem a pena de morte. Outros defendem uma medida
ainda mais radical: a execução sumária/sem julgamento. É o “bandido bom é
bandido morto”. Que pensar a respeito?
Nós espíritas não
deveríamos nos surpreender com a violência, pois sabemos do estágio
ainda bastante rudimentar de todos nós, espíritos encarnados na Terra.
Invés de ficarmos chocados e falando sobre o assunto, nós espíritas
deveríamos dirigir nossa atenção e energia atuando para que, ao longo do
tempo, a violência diminua até que finalmente se extinga. Somos
espíritos imortais, portanto importa pouco se esse progresso demorar
centenas ou milhares de anos. Temos tempo. Agora, claro, para nosso
bem-estar e felicidade, devemos agir para que atinjamos um melhor
estágio evolutivo o mais rapidamente possível.
Quanto à impunidade
que muitos usam tentando justificar uma violência injustificável, os
espiritas o sabem: essa impunidade é apenas aparente. Ninguém segue
impune. Os que causam o mal recebem o mal. Suas vidas são de tristeza em
tristeza, de sobressalto, insegurança e dor. Vivem atormentados por ver
a felicidade dos outros sem conseguir atingi-la. Precisam ficar vivos,
encarnados, entre nós, para que, por meio da dura experiência de vida,
sintam as dores que causaram aos outros e, exaustos de tanto sofrer, se
modifiquem. Assassina-los é falta grave, coisa de espíritos igualmente
bárbaros, no mesmo padrão do criminoso. Matar um criminoso ou um
inocente é a mesma coisa. É ir contra a lei de Deus. Além disso é
ineficiente pois, o que se mata é o corpo apenas. O ser, espírito,
raivoso, segue vivo, odiando ainda mais e agindo no mal, mas de forma
ainda mais eficiente, pois agora está invisível, sem o corpo. Veja as
perguntas 760, 761 e 880 do Livro dos Espíritos: “Quando os
homens estiverem esclarecidos, a pena de morte será completamente
abolida da terra.” e “É necessário, aliás, abrir ao criminoso a porta do
arrependimento, e não fechá-la.” E também: “Ninguém tem direito de
atentar contra a vida de seu semelhante nem fazer o que possa
comprometer sua existência.” Mais claro, impossível.
Mas Jesus falou da Pena de Talião: aquele que mata pela espada, pela espada perecerá…
O Espírito da Verdade na pergunta 764 do Livro dos Espíritos nos alerta: “A pena de Talião é a justiça de Deus; é ele que a aplica.”
Como resolver então a questão da segurança? O espiritismo diz algo a respeito?
Segurança
é trabalho de longo prazo que não se resolve com o armamento do homem,
mas sim com o desarmamento do espírito. Segurança tem a ver com nossa
ganância que é derivada de nossa pouca sofisticação como espíritos:
ainda achamos que o ter importa mais que o ser. Infelizmente parece que
ainda precisaremos de bons anos, talvez séculos, talvez milênios até que
os ataques violentos desapareçam da Terra.
Pascal, no Evangelho Segundo o Espiritismo,
capítulo 11, nos informa: “O egoísmo é o sentimento oposto da caridade.
Sem a caridade não haverá paz alguma na sociedade; e digo mais: não
haverá segurança. Com o egoísmo e o orgulho, que andam de mãos dadas,
haverá sempre uma corrida favorável ao espertalhão, uma luta de
interesses em que são pisoteadas as mais santas afeições, em que nem
sequer os laços sagrados da família são respeitados.”
De nada
adiantarão carros blindados, casas fortificadas e armas. Enquanto
imperar a ganância e a brutal desigualdade, haverá conflito e violência.
Ela, a violência, é a espora pontiaguda a nos exigir a mudança de
atitude. Ou construímos o amor e a justiça para todos, ou seguiremos
sofrendo com a violência.
Sabendo disso, nós espíritas deveremos nos
esforçar para expulsar o materialismo e o egoísmo de nosso íntimo.
Reforma íntima. As perguntas 742 e 799, também mencionam algo
importante: “No estado de barbárie, os povos conhecem apenas o direito
do mais forte.” e “(o espiritismo pode contribuir para o progresso)
Destruindo o materialismo, que é uma das chagas da sociedade, e fazendo
os homens compreenderem onde está seu verdadeiro interesse.”
E as questões da homossexualidade e de gênero? O que o espiritismo diz a respeito?
O
espirito encarna no corpo que necessita para sua vivência naquela
encarnação. Ou seja, não há engano. Recusar-se a viver aquela
experiência, é exatamente isso: uma perda de oportunidade, uma perda de
um conhecimento que importa àquele ser. Mas todos temos o nosso
livre-arbítrio. Se Deus respeita nosso livre-arbítrio, será que nós
temos o direito de desrespeitar o livre-arbítrio do outro? A pergunta
822 nos diz: “Os sexos aliás, existem apenas no corpo físico; uma vez
que os espíritos podem encarnar em um ou outro, não há diferença entre
eles nesse aspecto e, consequentemente, devem desfrutar dos mesmos
direitos.” Sabendo que o espírito não tem gênero definido e sabendo
ainda que nos convém respeitar, ou melhor, amar o nosso próximo; não
deveríamos amar os que vivem num gênero diferente do que seu corpo
físico apresenta? Se agem bem, se amam, se contribuem para o progresso
da humanidade, não deveríamos respeitá-los e amá-los? Teria Jesus uma
postura diferente? Recomendou ele o ódio ou o amor? Além do mais todos
nós encarnados na Terra, pertencemos a um único gênero: o gênero humano.
Quanto à homossexualidade pergunto: uma pessoa obesa pode casar-se
com outra pessoa obesa? Uma pessoa de alta estatura pode casar-se com
outra de alta estatura? E um portador de alguma deficiência física, pode
casar-se com outro portador de deficiência? Claro que sim, pois os
corpos não fazem diferença alguma no amor. Por que seria diferente com
dois corpos de homem ou de mulher?
Pode ser que nesta encarnação dois
espíritos que se amam, se apresentem um como homem e outro como mulher.
Ou esses mesmos dois espíritos que se amam podem estar em dois corpos
de mulher, ou em dois corpos de homem. Se esses espíritos se amam, se
cuidam de se apoiar mutuamente em seu crescimento no bem, se constituem
família, se auxiliam outros espíritos – seus filhos – em seu progresso
espiritual, moral e intelectual, que diferença faz como seus corpos se
apresentam?
E sobre o preconceito com pessoas de outras etnias, origens e religiões por exemplo?
Na
pergunta 803 do LE se lê: “Deus não deu a nenhum homem, superioridade
natural nem pelo nascimento nem pela morte: todos são iguais perante
Deus.” Já na pergunta 799 aprendemos que devemos: “Destruir os
preconceitos de seitas, de castas e de raças, ensinar aos homens a
grande solidariedade que deve uni-los como irmãos.” Lendo Kardec e
ouvindo a espiritualidade superior, fica claro como nós, espíritas,
devemos entender o mundo e nos comportar, não?
Multidões de miseráveis se deslocando de países pobres para
países ricos. Como o espiritismo prega a caridade, entendo que devemos
acolhê-los. Mas será que é justo ter mais gente, estrangeiros, a
competir com os habitantes do país pelos já escassos empregos? Se
acolhermos por exemplo os emigrantes venezuelanos, haitianos e
bolivianos, nós, os brasileiros, teremos ainda menos empregos!
Quem
é brasileiro? A maioria de nós descende de imigrantes europeus,
africanos, árabes ou asiáticos. E mesmo que sejamos descendentes puros
de nativos brasileiros, eles tampouco são brasileiros, pois quando
Portugal descobriu esta terra aqui, não era Brasil. E ainda, também
eles, os chamados nativos, vieram para estas paragens faz apenas uns
10.000 anos. Somos todos imigrantes que fomos acolhidos nesta terra.
Outro
ponto importante a lembrar é que somos cidadãos do universo e não do
Brasil. Encarnamos aqui. Depois em outro país. Depois em outro planeta.
Nosso amor é grande o suficiente para abarcar o universo e não apenas as
acanhadas fronteiras do país onde vivemos. A nós espiritas interessa o
bem de todos e não apenas dos que vivem mais perto da gente, que falam a
nossa língua ou que têm a mesma quantidade de melanina na pele.
E se
nada disso nos convencer, há ainda um argumento mais egoísta e
contundente: amanhã, nesta ou noutra encarnação, pode ser que seja a
nossa vez de passarmos pelo papel de emigrantes miseráveis, famintos,
desesperados, fugindo das bombas e da perseguição. Para que aprendamos
de tudo um pouco, sabemos, os papéis se invertem. Estamos preparados
para sofrer o que queremos impor aos outros? Causa e efeito. Sobre o
assunto nos fala o belíssimo texto “O homem de bem” do capítulo 17 de O Evangelho Segundo o Espiritismo:
“Seu primeiro impulso é o de pensar nos outros antes de si, acudir aos
interesses dos outros antes de procurar os seus. O egoísta, ao
contrário, calcula os ganhos e as perdas de toda ação generosa.”
Qual deve ser o papel do mais avançado intelectualmente, do
mais avançado moralmente e daquele que tem mais recursos, neste mundo
conturbado?
A solidariedade deve nos unir a todos. A vida é
uma escada onde o que está no degrau de cima deve dar a mão e ajudar na
escalada daquele que ainda está abaixo. As perguntas 685 e 779 nos
esclarecem: “O forte deve trabalhar pelo fraco.” e “Os mais avançados
ajudam pelo contato social o progresso dos outros.” Fraternidade.
O feminismo ressurgiu forte nestes tempos. O que nos diz o espiritismo sobre o direito da mulher?
Seguramente
o espiritismo não diz que a misoginia e o feminicídio são sinais dos
espíritos evoluídos. Faz 160 anos os espíritos já nos alertavam para
nosso erro – perguntas 822 e 818. “A emancipação da mulher segue o
progresso da civilização, sua subjugação marcha com a barbárie. ” e
“Para homens pouco avançados do ponto de vista moral, a força faz o
direito.”
Com todas essas enormes mudanças pelo que passa a Terra dá
para compreender que tenha aumentado a incidência do que você chamou de
doenças da alma. Como se vacinar contra a angústia e a depressão?
Se
alguém tem maior chance de compreender tudo o que acontece, esse alguém
é o espirita. Nós sabemos que todos somos iguais perante Deus. Sabemos
que já praticamos barbaridades em nossas encarnações anteriores (basta
ver a história da humanidade). Sabemos que ainda estamos longe da
perfeição, mas a caminho. E sabemos também que vimos reencarnando
justamente para nos aperfeiçoar.
Sabendo de tudo isso fica fácil
compreender que estamos no local adequado (Terra), no país adequado, na
família adequada, no emprego adequado, com as responsabilidades
adequadas e no momento histórico adequado. Não há engano. Merecemos
estar exatamente aqui e agora. E o chamado “tudo isso que está aí”; aí
está justamente para nosso crescimento. Nos pertence! Este é nosso
laboratório de aperfeiçoamento. Esta é nossa escola em nossa abençoada
oportunidade de crescermos em moral e intelectualmente. E é neste mundo,
cheio de fascinantes desafios, que podemos acelerar nosso progresso.
Quanto maiores e mais frequentes os desafios, maior nossa chance de
crescer mais rapidamente. É como se estivéssemos numa academia: quanto
mais nos exercitarmos mais fortes ficaremos. Um exercício após o outro.
Do mais simples ao mais elaborado, vamos vencendo todas as barreiras e
fortalecendo nossa musculatura moral e intelectual.
Depressão,
síndrome do pânico e suicídio são doenças também do corpo físico e que
requerem tratamento médico. Compreender quem somos, onde estamos, porque
estamos e para onde vamos, no entanto, pode nos ajudar muito na nossa
recuperação ou ainda, o que é melhor, nos ajudar a evitar entrar nesses
estados patológicos.
Em resumo
O espirita em 2019 deve ser melhor do
que foi em 2018. E mesmo sendo melhor do que foi em 2018, ele será pior
do que será nos anos seguintes. Em uma palavra: progridamos! Busquemos
nos melhorar. Que tal dirigir todo aquele esforço que fazemos para mudar
o outro para nós? Mudemos a nós mesmos.
O espirita, pelo que lemos em Kardec, deve ser alguém que estuda a si e ao outro. E usa o que observa para melhor a si mesmo. Melhorar sendo uma pessoa mais inteligente, menos preconceituosa, mais compreensiva, mais caridosa, mais aberta, mais sincera, mais calma, mais carinhosa, menos agressiva, mais justa e absolutamente honesta. Vivamos como espíritas, compreendendo a vida como algo muito maior e mais importante e belo, que os poucos anos que passamos encarnados na Terra, nesta nossa vida material. Ampliemos nosso horizonte e nossa visão. Assim fazendo, tudo toma nova perspectiva. Tudo fica menos urgente, menos grave e mais leve.
Se for preciso perdoar, perdoemos. Mas compreendamos que melhor que perdoar é não se ofender. Quem não se ofende, não se melindra, não se magoa, não quer mal ao outro e não precisa perdoar.
Muitos falam na importância de tolerar os que são diferentes de nós.
Mas melhor que tolerar é compreender. Tolerar pressupõe uma certa
arrogância. E tolerar é um sentimento que entrou meio torto, forçado,
arranhando. Tolerar é abrir uma concessão a contragosto. Não é tão bom.
Compreender
é muito melhor e mais nobre que tolerar! Quem compreende assente. Quem
compreende reconhece de bom grado, com o coração e a mente tranquilos,
aquele que é diferente de si. Quem compreende percebe que o mundo é
diverso e que isso importa. Busquemos em 2019 e sempre, compreender.
A compreensão nos trará alivio, saúde e paz. E nos permitirá amar ao outro e a nós mesmos.
O belo capítulo 17 de O Evangelho Segundo o Espiritismo resume bem o que deve ser nosso comportamento, como espíritas:
“Reconhece-se o verdadeiro espírita por sua transformação moral e pelos esforços que faz para dominar suas más tendências; enquanto um se satisfaz em seu horizonte limitado, o outro, que compreende um
pouco mais, esforça-se para se libertar dele e sempre o consegue, quando tem uma vontade firme.”
Calma.
Em 2019, e sempre, está tudo certo.
Feliz Ano Novo!
*ALEXANDRE CALDINI é formado em administração de empresas pela PUC/SP com cursos de educação executiva em Harvard e no M.I.T. nos Estados Unidos, no INSEAD na França, e na London Business School e na Universidade de Cambridge na Inglaterra. Foi presidente da Editora Abril e do jornal Valor Econômico. Caldini – que tem vários vídeos comentando aspectos de nosso dia a dia na visão espírita – é escritor. Seus livros A Morte na Visão do Espiritismo e A Vida na Visão do Espiritismo, têm 100% dos direitos autorais doados às Casas André Luiz de Guarulhos/SP.
Publicado no jornal Correio Fraterno – edição 484 – novembro/dezembro 2018
Fonte: Correio Fraterno