Qual o significado de reencarnar?

por Dorival Strelow
Qual o significado de reencarnar?
Rogério Miguez
rogmig55@gmail.com

A palingenesia, ou crença na reencarnação, existe desde tempos imemoriais. Civilizações na Índia, Pérsia, Grécia, entre tantas pujantes culturas, já compreendiam ser inviável a proposta da unicidade da existência, que não satisfazia a razão, tampouco íntimos anseios diversos.

Palingenesia vem do grego, palavra formada pelo prefixo palin, significando repetição, e genes, nascimento; desta forma, o conjunto expressa repetição de nascimentos.
Embora aceita e ensinada em passado longínquo, o conceito original se perdeu através dos tempos, e hoje em dia, falar de vidas sucessivas cria de imediato certo desconforto, sugerindo uma proposta fantasiosa, destituída de qualquer razão, por muitos associada de pronto à antiga civilização egípcia, imaginando-se a ressurreição de múmias, faraós e quem sabe faranis.
Lei de Deus, das mais básicas, se imporá naturalmente às sociedades, quando a proposta da vida única se esgotar por força de sua própria fragilidade, aceitando-se então, como os Antigos: para resolver questões fundamentais, tais como – mortes prematuras, tendências inatas, precocidade de talentos, doenças congênitas, entre tantas outras situações enigmáticas –, só com a aceitação da palingenesia. Além destas, para bem entender a Justiça e Misericórdia de Deus, só por meio da lei das reencarnações.
A Doutrina dos Espíritos não inventou esta lei, pois, sendo princípio divino, ela existe de todos os tempos; a contribuição da Doutrina se verifica na recuperação do verdadeiro conceito, buscando torná-lo mais popular, desmistificando-o.
A necessidade ou mesmo a obrigatoriedade de reencarnar encontra o seu termo, quando o Espírito alcança o ápice de seu processo evolutivo, não precisando mais, a partir de então, passar por expiações e provas, alcançando a condição de só voltar a um corpo de carne em missão.
Apesar de a ideia original ter se perdido, vez por outra criam-se novas doutrinas ou propostas, baseadas no conceito verdadeiro, mas distanciadas do seu fundamento. É o caso da proposta de reencarnar no Plano Espiritual.
Como se denota na proposta da reencarnação, o nome já sugere, ressalta do termo; reencarnar, como visto, significa tomar um novo corpo “de carne”, material. É cristalino este significado, entretanto, alguns creem na possibilidade de reencarnações no Plano Espiritual.
A posição doutrinaria é direta, transparente, Espírito não gera Espírito, tampouco corpo de carne; não há matéria densa no Plano Espiritual, não há sexo material no Espaço, não existe sexualidade na erraticidade como a entendemos aqui na Terra. Ora, se isto é fato, como explicar a tese da reencarnação espiritual? Seria uma lei desconhecida de todos nós? Se assim fosse, já teria sido certamente pelo menos ventilada nas obras básicas. Allan Kardec, seguramente, teria recebido informações dos Espíritos neste sentido. Não se compreende que mecanismo tão relevante, caso fosse verdadeiro, tivesse sido deixado de lado, para ser descortinado no futuro, apenas por um ou outro médium.
Muitos seguidores desta tese, cremos, o fazem pela conhecida razão de não se aprofundarem no estudo e meditação dos postulados espíritas magnificamente delineados nas obras básicas. Leem uma ou outra obra, e mesmo assim, às vezes parcialmente e, desta forma, despreparados, se maravilham com a possibilidade de Espíritos desencarnados engravidando e promovendo nascimentos no plano etéreo, esquecidos ou mesmo ignorantes de que quem individualiza os Espíritos é Deus. Há incontáveis coordenadores e técnicos no Plano Espiritual, atuando na matéria para ligar Espíritos em novos corpos físicos toda vez que se faz necessário viabilizar uma nova reencarnação. Não se tem notícia da existência de Espíritos encarregados de promover reencarnações no Plano Espiritual, pelo menos em obras espíritas.
Entretanto, não nos alonguemos mais, não percamos tempo em levantar explicações e raciocínios quanto à possibilidade da “reencarnação” no plano etéreo. Em vez disso, lancemos mão da verdadeira literatura espírita para projetar luz, e luz intensa e suficiente, capaz de ofuscar esta teoria absurda.
No quarto livro do pentateuco espírita, O céu e o inferno (1), encontram-se em sua Segunda parte elucidativos depoimentos de Espíritos felizes, entre outros, o testemunho do Espírito Sanson, membro da Sociedade Parisiense de Estudos Espíritas, desencarnado em 21 de abril de 1862. Prevendo a sua desencarnação próxima, roga que, após o seu desenlace, fosse evocado para dar informações sobre o Mundo dos Espíritos, ao qual seguramente todos voltarão.
Evocado em 25 de abril de 1862, apenas quatro dias após a sua morte, comparece pela segunda vez, pois já havia sido evocado no dia 23 de abril, e nesta segunda participação, entre outras respostas significativas, informa o seguinte:

Os Espíritos não têm sexo; entretanto, como até poucos dias atrás éreis um homem, desejamos saber se no vosso novo estado tendes mais da natureza masculina ou da feminina? E o mesmo que se dá convosco poder-se-á aplicar ao Espírito desencarnado há muito tempo?– R. Não temos motivo para ser de natureza masculina ou feminina: os Espíritos não se reproduzem. Deus os criou como quis e, tendo que lhes dar a encarnação sobre a Terra, segundo seus maravilhosos desígnios, subordinou-os às leis de reprodução das espécies por meio das condições peculiares ao macho e à fêmea. Contudo, deveis sentir, mesmo sem maiores explicações, que os Espíritos não podem ter sexo. (Grifo nosso).(2)

Mais claro impossível, como nos afirmou Sanson: os Espíritos não se reproduzem!Para não deixarmos todo o peso desta impossibilidade nas mãos de Sanson, estudemos um pouco mais.

O relato desta evocação inserida em O céu e o inferno e publicado em 1865, foi originalmente registrado na Revista Espírita de junho de 1862, (3) publicado na íntegra, com observação de Allan Kardec:

Sempre foi dito que os Espíritos não têm sexo; os sexos só são necessários para a reprodução dos corpos; como os Espíritos não se reproduzem, o sexo seria inútil para eles. Nossa pergunta não visava constatar o fato, mas, por causa da morte muito recente do Sr. Sanson, queríamos saber se lhe restava uma impressão de seu estado terreno. […] (Grifo nosso).

Temos assim a posição do sábio de Lyon, quando previamente já havia se posicionado sobre a questão. No entanto, será mesmo que estamos sossegados em nosso íntimo, convencidos da impropriedade da proposta da reencarnação no plano da vida verdadeira? Se não, avancemos um pouco mais, retrocedendo ainda no tempo, agora ao ano de 1866. Vejamos o que encontramos, sobre o assunto, na Revista Espírita de janeiro do citado ano: (4)

As almas ou Espíritos não têm sexo. As afeições que os unem nada têm de carnal e, por isto mesmo, são mais duráveis, porque fundadas numa simpatia real e não são subordinadas às vicissitudes da matéria. […]Os sexos só existem no organismo; são necessários à reprodução dos seres materiais. Mas os Espíritos, sendo criação de Deus, não se reproduzem uns pelos outros, razão pela qual os sexos seriam inúteis no Mundo Espiritual. (Grifo nosso).

Constata-se assim, mais uma vez, a impossibilidade de haver reencarnação no Espaço, ou seja, geração de corpos materiais por Espíritos desencarnados, frisamos, analisando tão somente obras escritas por Allan Kardec.

REFERÊNCIAS:
1 – KARDEC, Allan. O céu e o inferno. Trad. Evandro Noleto Bezerra. 2. ed. 1. imp. Brasília: FEB, 2016. cap. 2.
2 – ______. ______. it. 11.
3 – ______. Revista Espírita: jornal de estudos psicológicos. ano 5, n. 6, jun. 1862. Conversas familiares de Além-Túmulo – Sr. Sanson (Terceira conversa – 2 de maio de 1862). Trad. Evandro Noleto Bezerra. 3. ed. 2. reimp. Brasília: FEB, 2009.
4 – ______. ______. ano 9, n. 1, jan. 1866. As mulheres tem alma?. Trad. Evandro Noleto Bezerra. 2. ed. 2. reimp. Brasília: FEB, 2009.
Fonte: Reformador, Agosto de 2018.
Fonte: Luz Espírita

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